sábado, 26 de janeiro de 2008
quinta-feira, 24 de janeiro de 2008
Laços, porque os crio assim
Andamos em voltas rectas
Na mesma esfera,
Onde ao menos nos vemos
Porque o fumo passou.
Na mesma esfera,
Onde ao menos nos vemos
Porque o fumo passou.
A chuva no chão revela,
Os olhos por trás.
Há que levar o que restou
E o que o tempo queimou.
Tens fios de mais
a prender-te as cordas,
Mas podes vir amanha,
Acreditar no mesmo Deus
Tens riscos demais,
A estragar-te o quadro.
Se queres vir amanha,
Acreditar no mesmo Deus
Devolve-me os laços, meu amor!
Devolve-me os laços..
Andamos em voltas rectas
Na mesma esfera
Mas podes vir amanhã
Se queres vir amanhã
Podes vir amanhã
Tens riscos de mais
A estragar-me a pedra
Mas se vieres sem corpo
À procura de luz
Devolve-me os laços, meu amor!
Meu amor...
sábado, 19 de janeiro de 2008
domingo, 13 de janeiro de 2008
Aceitar. E deixar passar...
Estava só, num deserto.
Avistei uma caravana aproximar-se, cruzando-se no meu caminho. Este era um
comerciante, cheio de coisas vistosas, apeteciveis, excitando o meu lado consumista.
Claro que as primeiras coisas que me mostrou foram as melhores, dos seus segredos, aquelas com que a todos encanta. Contavam-se pelos dedos de uma mão, coisas encantadoras... Estava realmente cheio de bugigangas. Só que... nem todas aparentavam ser de tão má qualidade.Cinco meses...precisou ele para me mostrar tudo o que tinha. Aos poucos, percebi que até as coisas encantadoras, só passavam pela aparência. Que nas minhas mãos oxidaram com o meu suor, quando as peguei para experimentar.Perdi tanto tempo debaixo daquele Sol, desidratei de tanto suor, tanta sede, tanto tempo ali parada...E no fundo, ele sabia que nada me estava a vender. Que nada eu iria comprar. Com tanta coisa má, que bastava eu pedir para ver com as mãos e me aperceberia logo que nada valiam aquelas coisas todas...que nem se quer dinheiro eu possuia... não me ia vender nada.Ele não me estava a vender nada... Então, comerciante? Quem é aquele homem? Um ladrão?? Mas...roubou-me o quê? Meu tempo...meu coração...minha cabeça...meu corpo...meus olhos...minha saúde...minha paciência...e ainda lhe comprei algumas peças que me mostrou no princípio, sem ainda lhes ter pegado, onde me endividei...Ele não me queria vender nada... Porque fui tão enganada?Comerciante...e não me vendeu nada.Ao fim de 5 meses, sabendo ele que nada me iria vender, desistiu e começou a arrumar as coisas de volta na caravana. Com todo o cuidado, fiquei, e perdi mais esse tempo, sabendo que nada lhe iria comprar...ajudando-o a embrulhar aquelas misérias todas de volta, na caravana...Como se nada tivesse passado, ao fim desse tempo, ficamos os dois a olhar um para o outro. Questionando-nos, provavelmente, o que estavamos os dois a fazer durante tanto tempo, fingindo ele que me iria vender e eu que me iria empenhar para comprar aquilo tudo.É difícil, ainda assim, dizer "Adeus"...percebi.Alguém tinha de dar o primeiro passo e regressar ao seu caminho. Aos seus olhos, disseram os meus "Aceito".E deixei-o passar...
sábado, 12 de janeiro de 2008
Ode à incompreensão
"Não por mim. Por tudo o que, para ecoar-se,
não encontrou eco. Por tudo o que,
para ecoar, ficou silencioso, imóvel -
- isso me dói como se ausência a música
não tocada, não ouvida, o ritmo suspenso,
eminente, destinado, isso me dói
dolorosamente, amargamente, na distância
do saber tão claro, da visão tão lúcida,
que para longe afasta o compassado ardor
das vibrações do sangue pelos corpos próximos.
Tão longe, meu amor, te quis da minha imperfeição,
da minha crueldade, desta miséria de ser por intervalos
a imensa altura para que me arrebatas
- meu palpitar de imagem à beira da alegria,
meu reflexo nas águas tranquilas da liberdade imaginada-,
tão longe, que já não meus erros regressassem
como verdade envenenando o dia a dia alheio.
Tão longe, meu amor, tão longe, quem de tão longe alguma vez regressa?! E quem, ó minha imagem, foi contigo? (De mim a ti, a mim, quem de tão longe alguma vez regressa?)"
não encontrou eco. Por tudo o que,
para ecoar, ficou silencioso, imóvel -
- isso me dói como se ausência a música
não tocada, não ouvida, o ritmo suspenso,
eminente, destinado, isso me dói
dolorosamente, amargamente, na distância
do saber tão claro, da visão tão lúcida,
que para longe afasta o compassado ardor
das vibrações do sangue pelos corpos próximos.
Tão longe, meu amor, te quis da minha imperfeição,
da minha crueldade, desta miséria de ser por intervalos
a imensa altura para que me arrebatas
- meu palpitar de imagem à beira da alegria,
meu reflexo nas águas tranquilas da liberdade imaginada-,
tão longe, que já não meus erros regressassem
como verdade envenenando o dia a dia alheio.
Tão longe, meu amor, tão longe, quem de tão longe alguma vez regressa?! E quem, ó minha imagem, foi contigo? (De mim a ti, a mim, quem de tão longe alguma vez regressa?)"
quarta-feira, 9 de janeiro de 2008
A Instabilidade e Imprevisibilidade do Nosso Comportamento
Não deveis estranhar se hoje vedes poltrão aquele que ontem vistes tão intrépido: ou a cólera, ou a necessidade, ou a companhia, ou o vinho, ou o som de uma trombeta, tinham-lhe incutido coragem. Não se trata de uma coragem que a razão haja modelado; foram as circunstâncias que lhe deram consistência; não espanta, pois, que circunstâncias contrárias a tenham transformado. Esta tão flexível variação e estas contradições que em nós se vêem, fizeram com que alguns imaginassem termos duas almas, e que outros supusessem que dois poderes nos acompanham e agitam, cada qual à sua maneira, um tendendo para o bem, o outro para o mal, já que tão brutal diversidade não poderia atribuir-se a uma só entidade.
Não somente o vento dos acidentes me agita consoante a direcção para que sopra, mas, ademais, eu agito-me e perturbo-me a mim próprio pela instabilidade da minha postura; e quem, antes do mais, se observar, nunca se achará duas vezes no mesmo estado. Confiro à minha alma ora um rosto ora outro, conforme o lado sobre que a pousar. Se falo de mim de diferentes maneiras é porque de maneiras diferentes me observo. Toda a sorte de contradições se podem encontrar em mim sob algum ponto de vista e sob alguma forma. Envergonhado, insolente; casto, luxurioso; tagarela, taciturno; duro, delicado; inteligente, estúpido; irascível, bonacheirão; mentiroso, veraz; douto, ignorante; generoso, avaro e pródigo: tudo isto vejo em mim de algum modo, conforme para onde me viro. Quem quer que se estude a si próprio muito atentamente, encontra em si, e até no seu mesmo juízo, igual volubilidade, igual discordância. Não há nada que eu possa dizer de mim numa só palavra de modo absoluto, único ou inabalável, sem incluir mesclas ou misturas.
Michel de Montaigne, in 'Ensaios - Da Inconstância das Nossas Acções'
Apenas nas Crises Atingimos as Nossas Profundezas
Tudo o que o nosso corpo faz, excepto o exercício dos sentidos, escapa à nossa percepção. Não damos conta das funções mais vitais (circulação, digestão, etc.). O mesmo se passa com o espírito: ignoramos todos os seus movimentos e transformações, as suas crises, etc., que não sejam a superficial ideação esquematizante. Só uma doença nos revela as profundezas funcionais do nosso corpo. Do mesmo modo, pressentimos as do espírito quando estamos em crise.
Cesare Pavese, in 'O Ofício de Viver'
Anomalias
Como ainda é inexperiente quem supõe que, ao mostrar espírito e entendimento, recorre a um meio seguro para fazer-se benquisto em sociedade! Na verdade, na maioria das pessoas, tais qualidades despertam ódio e rancor, que serão tão mais amargos quanto quem os sentir não tiver o direito de externar o motivo, chegando até a dissimulá-lo para si mesmo. Isso acontece da seguinte forma: se alguém nota e sente uma grande superioridade intelectual naquele com quem fala, então conclui tacitamente e sem consciência clara que este, em igual medida, notará e sentirá a sua inferioridade e a sua limitação. Essa conclusão desperta o ódio, o rancor e a raiva mais amarga.
(...) Mostrar espírito e entendimento é uma maneira indirecta de repreender nos outros a sua incapacidade e estupidez. Ademais, o indivíduo comum revolta-se ao avistar o seu oposto, sendo a inveja o seu instigador secreto. A satisfação da vaidade é, como se pode ver diariamente, um prazer que as pessoas colocam acima de qualquer outro, mas que só é possível por intermédio da comparação delas próprias com os demais. No entanto, nenhum mérito torna o homem mais orgulhoso do que o intelectual: só neste repousa a sua superioridade em relação aos animais. Exibir superioridade decisiva nesse domínio, e ainda por cima diante de testemunhas é, portanto, a maior ousadia. O opositor sente-se desafiado por tal conduta a praticar vingança e, na maioria das vezes, procurará uma oportunidade para a exercer pela ofensa, passando então do domínio da inteligência para o da vontade, no qual somos todos iguais. Enquanto a posição social e a riqueza podem contar sempre com a alta consideração na sociedade, os méritos intelectuais nunca devem esperar por ela. Nos casos mais favoráveis, serão ignorados; senão, serão vistos como uma espécie de impertinência ou como um bem, que o seu possuidor adquiriu ilicitamente e ainda se atreve a jactar-se. Eis porque cada um se propõe, em segredo, a humilhá-lo de outra forma, esperando apenas a oportunidade mais propícia para o fazer. Mesmo o comportamento mais humilde terá muita dificuldade em conseguir o perdão para a sua superioridade intelectual.
Arthur Schopenhauer, in 'Aforismos para a Sabedoria de Vida'
terça-feira, 8 de janeiro de 2008
Ninguém Permanece Satisfeito Com o Que Tem
Ninguém permanece satisfeito com o que tem, olhando para o que é dos outros; é por isso que nos iramos até contra os deuses quando alguém nos ultrapassa, esquecidos dos homens que ficam para trás; e, quando há poucos homens para invejar, aqueles que seguem atrás de nós são invejosos terríveis. Mas o homem é tão mesquinho que, mesmo tendo recebido muito, considera-se injuriado se pudesse ter recebido mais. (...) Sobretudo, agradece aquilo que recebeste; aguarda pelo restante e alegra-te por não estares ainda satisfeito: é um prazer haver algo por que esperar. Venceste todos os homens: alegra-te por seres o primeiro no coração do teu amigo; foste vencido por muitos: considera quantos homens estão atrás de ti, mais do que quantos estão à tua frente. Queres saber qual é o teu maior vício? Fazes mal as contas: valorizas demasiado o que te oferecem, mas desvalorizas o que tens.
Séneca, in 'Da Ira'
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